Segundo texto da série especial produzida pelo Cedem/Unesp destaca a mobilização da classe operária mundial contra o conflito que tomava grande parte do continente europeu e que se prolongava, tirando a vida de milhares de trabalhadores nos campos de batalha.
Trabalhadores do mundo unidos contra a Grande Guerra
Por Renata Cotrim, historiadora
No meio sindical francês de fins do século XIX surgiu o sindicalismo revolucionário. Tratava-se de corrente autônoma, com corpo teórico próprio, que influenciou o movimento operário em diversas partes do mundo e apresentava programa mínimo de ação sindical. Tinha por objetivo reunir o operariado numa organização única, independente de sua tendência política ou credo religioso. De acordo Joana Dias Pereira:
“Segundo esta nova concepção da luta de classes, a ação direta dos trabalhadores contra o patronato e o Estado conquistaria regalias imediatas, mas também teria uma componente pedagógica. No decorrer da luta, o operariado organizado tomaria consciência da sua força e compreenderia que podia gerir a sociedade em seu proveito, através das associações de classe. O futuro seria a gestão sindical. Adotando e adaptando postulados marxistas e libertários, esta doutrina conciliará socialistas, acratas e sindicalistas puros, alcançando a hegemonia em muitas associações de classe por todo o mundo ocidental (PEREIRA, 2011, p.199).
A guerra, que se já se apresentava como longa e penosa, foi um elemento que colaborou para unir as lideranças do movimento operário. Em 26 de fevereiro de 1915, o Ateneo Obrero Sindicalista de Ferrol, na Espanha, tornou pública a convocação para o Congresso Internacional Pró Paz. O objetivo deste encontro era reunir organizações operárias de todo o mundo para organizar a oposição efetiva dos trabalhadores à Primeira Grande Guerra, mediante o boicote ao tráfico de mercadorias e a possível convocatória de Greve Geral. O período escolhido para a realização do evento foram os dias 30 de abril e 1 e 2 de maio de 1915. Era necessário escolher um país neutro para sediar o Congresso, razão pela qual optou-se pela Espanha. O Congresso, a ser realizado na cidade de Ferrol, atraiu militantes de diversas partes do mundo, entre eles portugueses, espanhóis, italianos, norte-americanos, latino-americanos (brasileiros, argentinos e uruguaios), entre outros.
Às vésperas do início do evento, o governo espanhol proibiu a sua realização. Sabe-se que houve interceptação de correspondências e a expulsão de delegados estrangeiros. Ainda assim, alguns militantes portugueses, representantes de organizações sindicais, ateneos sindicalistas, centros de trabalhadores e grupos anarquistas, reuniram-se clandestinamente e deliberaram a criação de um Comité Permanente do Congresso, encarregado de elaborar a cada quinzena um discurso revolucionário destinado às trincheiras. A sede escolhida para o Comitê foi Lisboa.
O Movimento Operário Brasileiro
O sindicalismo revolucionário era a orientação predominante na vida sindical dos principais centros industriais brasileiros. A principal estratégia era a de manter os sindicatos livres de qualquer orientação religiosa ou política, incluindo-se o próprio anarquismo, e propiciar a convivência entre militantes de diferentes correntes ou credos religiosos. Observe-se que sindicalismo revolucionário não era sinônimo de anarquismo, ainda que a presença desta corrente fosse significativa, conforme explicita Oliveira:
“[…] se a concepção predominante na organização sindical da Primeira República era o sindicalismo revolucionário, coube aos anarquistas grande parte da responsabilidade de sua divulgação e da repercussão atingida. Neste sentido, pelo menos do ponto de vista dos anarquistas que o propagavam, o sindicalismo revolucionário foi muito mais um método de ação do que propriamente uma corrente política autônoma. Os anarquistas o viram como o meio para manterem-se atuantes no meio operário para conseguir adeptos e combater seus adversários” (OLIVEIRA, 2009, p.31).
Na historiografia a respeito do movimento operário brasileiro na Primeira República, em que predominam os estudos sobre São Paulo e Rio de Janeiro, então as cidades mais importantes do ponto de vista da produção industrial, é patente o predomínio do anarquismo nos meios sindicais. Os dois grupos atuantes, o anarco-comunismo e o anarco sindicalismo, embora com diferenças entre suas concepções e métodos de luta, eram grupos anarquistas que estavam muito próximos em termos dos seus métodos e objetivos, diferenciando-se sobretudo no peso que atribuíam aos sindicatos como elemento estratégico para a destruição do capitalismo (OLIVEIRA, 2009, p.30).
Referências bibliográficas:
PEREIRA, Joana Dias.O sindicalismo revolucionário: a história de uma ideia. Dissertação (Mestrado em História Contemporânea). Lisboa: Departamento de História, Universidade Nova de Lisboa, 2011.
OLIVEIRA, Tiago Bernadon de. Anarquismo, sindicatos e revolução no Brasil (1906-1936). Tese (Doutorado em História). Rio de Janeiro: Departamento de História, Universidade Federal Fluminense, 2009.
Leia os textos da série:
Primeira Grande Guerra (Texto 1)
Confederação Operária Brasileira (Texto 3)
I Congresso da Paz e a classe operária brasileira (Texto 4)
Em meio à carnificina, a solidariedade operária (Texto 5)