Por Pedro Fassoni Arruda [1]
Hoje, dia primeiro de abril, é o momento de recordar um dos episódios mais tristes de nossa história. Há exatos 56 anos, um movimento civil-militar derrubou o presidente João Goulart e instalou uma ditadura que duraria 21 anos.
O pretexto dos golpistas era acabar com a corrupção, combater o comunismo e defender os valores da “família tradicional”. Jornais, revistas e emissoras de televisão da época (os mesmos de hoje) desencadearam uma campanha para desmoralizar um presidente que, longe de ser um revolucionário, pretendia apenas dar uma feição um pouco mais “humana” ao capitalismo brasileiro. Goulart defendia a reforma agrária, a concessão do direito de voto aos analfabetos, a reforma universitária, um sistema tributário progressivo, o controle das remessas de lucro das empresas estrangeiras, o planejamento urbano e mais uma série de medidas progressistas que ampliariam o mercado consumidor interno.
Contra Goulart, voltaram-se todos os ódios e ressentimentos de grupos que não estavam interessados em defender direitos e sim privilégios. Nas capitais, organizaram-se as conhecidas “Marchas da família com Deus”: a fração mais conservadora da classe média engrossou o coro dos barões midiáticos e saiu às ruas contra a ameaça (totalmente imaginária) de destruição das liberdades individuais.
Sob o pretexto de defender a liberdade, apoiaram a ditadura. Goulart caiu, e com ele todas as franquias democráticas: foi instaurada a censura aos meios de comunicação. Não havia mais liberdade de manifestação do pensamento. Grupos de esquerda foram perseguidos. Houve cassação arbitrária de direitos políticos e mandatos parlamentares. Pessoas foram presas arbitrariamente e torturadas, algumas foram executadas sumariamente. Cadáveres foram ocultados e os familiares não tiveram direito a sepultar os cadáveres. Muitos foram obrigados a deixar o país, sem levar nada a não ser a roupa do corpo.

Enquanto a maioria da população sofria, alguns poucos comemoravam e ganham muito dinheiro. A corrupção foi institucionalizada. Quem aplicou o golpe, o fez para continuar roubando e não o contrário. Tratava-se de uma ditadura de classe, a ditadura do capital, a ditadura da burguesia. Os golpistas, que haviam tentado derrubar Vargas e Juscelino, jamais admitiam que eram golpistas. Se autodeclaravam “revolucionários”, e diziam se tratar de um impeachment previsto na Constituição (o que era totalmente falso).
Quando a ditadura acabou, 21 anos depois, o Brasil havia piorado. Os ricos ficaram mais ricos e os pobres ficaram mais pobres. A corrupção tornou-se endêmica. O torturadores não tiveram que sentar no banco dos réus, e puderam viver tranquilamente sem serem incomodados. O Brasil ficou mais desigual, mais dependente, mais injusto e mais subserviente ao capital estrangeiro.
A história não é linear e está sujeita a retrocessos. Assim como o país retrocedeu em 1964, também retrocedemos depois do golpe de 2016. Os mesmos grupos – latifundiários, empresários de mídia, banqueiros, industriais, fascistas cobertos com a bandeira do Brasil etc. – desferiram mais um duro golpe e ainda conseguiram cooptar uma parte da classe trabalhadora. Mas seguiremos resistindo e enfrentando os conservadores e reacionários. Amanhã vai ser outro dia.
[1] Pedro Fassoni Arruda é bacharel em Direito, Mestre e Doutor em Ciências Sociais e Professor da PUC-SP.